terça-feira, 25 de agosto de 2015

Nunca soube

Nunca soube escrever. Sempre achei que sim, sempre houve algo que tilintava na minha cabeça e dizia "Ah se calhar não és assim tão mau...". Pensamentos parvos de puto que pensa que o amor é uma vela num apagão. Boa sorte, Júlio, há mais que se lhe diga! E agora não sinto nada senão um grande vazio, um vazio enorme, mas tão, tão grande, que acho que consigo ver pequenas coisas a preenchê-lo, ironicamente, embora isso não me apazigue de todo, continuo vago. Desisti de procurar quem me preenchesse; quem como quem diz, não é? Hoje em dia até algo me poderia ocupar, mas até as coisas que acho que vão de facto deixar-me de certo completo, acabam por ser mais coisas pequeninas a flutuar dentro de mim; já as esqueci; nem lembro do que falavam. Eram de amor? Paixão? Amizade? Aventura? Nem um. Nenhum. Nem sei. Nunca soube? Quem me deu o talento do egocentrismo que mo tire, não sou, ou pelo menos não era para ser, nasci inocente e ingénuo, deixaram-me ciente do que sou e de que odeio o que sou. Este texto não é sobre mim, é sobre não ser sobre mim, porque realmente não é? Estou farto. Mais que farto cansado, cansado de não ser. Deixem-me ser para apagar esta merda, outra futilidade que escrevo, cientemente, na falta de verso, melodia, estética; é tudo tão feio, tudo tão parecido, comigo. Não sei escrever e tudo porque não sei ser.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Índole

   A mente humana, ou pelo menos as que tenho conhecido, tende a fugir. Quando qualquer tipo de adversidade nos confronta temos vários caminhos a seguir: os que contornam os obstáculos, os que os ignoram como inexistentes, os que fingem uma falsa existência de um meio para o fim, e, raramente, os que destroem os seus obstáculos, exterminam-os sem pensar duas vezes.
   Infelizmente poucos são os que têm a capacidade de seguir o caminho mais difícil e enfrentam os seus medos e em paralelismo a maior parte de nós, meros mortais, evitam os nossos próprios conflitos pessoas e caímos numa espiral descendente de mentira e fuga a nós próprios.
   Não julgo nem recrimino  qualquer um dos caminhos que sigam na vida, eu próprio sei que não faço parte da minoria corajosa, mas sei que qualquer um dos caminhos, que não a aniquilação dos nossos demónios, devora-nos por inteiro com o tic-tac estalado dos relógios; acabamos arruinados, pelo nosso medo de ser, por dentro (somos o Templo Grego majestoso e imponente que é lentamente erodido e danificado e despedaçado pelas areias de Cronos). Procuro sempre a escapatória à auto-mutilação, auto-fuzilação, auto-bombardeamento, mas é inevitavelmente mais forte que a minha vontade de ser alguém que eu mesmo.
   E quando se quebra não se volta a montar, nem a resina mais peguenta em toda a Terra conseguiria meter-nos como a linda jarra Ming que éramos no início; teremos sempre grandes marcas da fractura, da queda, inesquecivelmente dolorosa. Cicatrizes de viver.
   Esta é a essência que nos compõe enquanto espécie avançada, civilizada, sensitiva.



   Queres fugir? Foge, então! Mas pelo menos deixa-me fugir contigo. Destruir-nos-emos com o tempo mas será fogo de artifício.
   Queres morrer? Morre, então! Já estou morto de qualquer forma se não podes ser tu comigo e nós for ficção.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Saber Saber

Sei que sei que não é loucura.
Sei que sei que não é demência nem devaneio.
Sei que sei que não é mente numa partitura
Vinculada, clássica, metódica, previsível no seu enleio.

No entanto, sei que o que sei é desejo,
Desejo de te querer como eterno meu...
Mas, neste conto de fadas, és a águia e eu Prometeu...
Ai! Se toda a alucinação, tentação não fosse do que em ti vejo...

(O cheiro a tabaco
Empesta o meu quarto.
O pensamento quente de ti
É o fumo que percorre os pulmões em mim.

A luz é baça e escura
Como o sentimento que já não sei sentir
Sem haver depois a negação de cura
Que é olhar e ver e viver sem ti.)


Não! Está calado, por favor!
Nem mais um sorriso! Nem mais um olhar!
Nem mais um pensar do pensamento que me deixa de pavor!
Nem mais uma pureza nesse teu doce silvar!

E depois descubro que o que sei que sei
É ilusão, fruto de imaginação fértil.
Produto de um ser apagado e frágil.
Mas ainda assim queria fazer disto uma realeza, e tu, o Rei.

E saber saber? Não sei!

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Estranhar

Sou um parasita deste corpo que digo meu. É fragmentação do que me é físico e sinto do não querer ser e do cansaço de tentar não ser. Contam-se três compassos completamente diferentes naquele relógio, na mesma melodia, assíncronos e sem jeito; morto, velho e pútrido. E dos três nem um me coube ser porque de ouvir o que tinha esquecido, não fui e não serei; só o espaço entre ondas, repetidas, noctívagas, descontextualizadas.

E ainda se tem a falta de carácter e discernimento para pedir a inexistência quando lhe é concebida no deambular de um pensamento. Cessai. Pedir o que é seu desde o princípio, esquecer o conceito de posse, esquecer que existe e não.

Parasita, um vírus, precisa de um algo no que sobreviver, e, não é que este sobrevivia do que restava de si? Canibalismo ou fome de não ser? De desistir, cessar existência. Dói. Ironicamente dói. Infelizmente dói. Infelicidade não da dor em si mas sim de saber que está lá. Folgar em saber que não falta muito, morrer de saber que acabei de pensar.

domingo, 4 de maio de 2014

Estou despedaçado

Quero um fim.
Não quero um princípio ou um meio,
Só um infindável redutor fim.
Transtornado este viver de enleios.

A vida faria mais sentido
Se não existisse de todo,
Pois este viver cuspido
Não passa de mais um andar torto.

Fragmentária a memória
Que queria não lembrar até.
Não passou de mais uma escória
Que só a enfrento se aplaudir de pé.

E queria esquecer tudo o que não vivi
Porque aquilo e aquilo que esqueci de fazer
Não passam de fragmentos do tempo em que caí.

E a última sonata por ouvir, viver,
Será aquela que não tem som
Pois só ela, e ela só, fará ferver
O meu sangue com a melancolia sem tom.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Extemporâneo

Um cheiro primaveril
Pairava no ar
E o Inverno nem chegara ainda.

Para uns já era algo sazonal,
Só colhiam da árvore vital
Na altura em que
Todas as flores desabrochavam.

Era o fruto da época da Primavera,
Mas pelos meios mais inortodoxos
Desfrutei da surpresa da Natureza
No tempo em que nada havia de nascer.

O movimento retardado de crescimento
Proporcionou as melhores condições
Para um broto vir ao de cima (ou ao de baixo).

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Desencontrados

Já te foste embora. Não é algo novo, já está habituado a despedidas mas nunca consigo suportar a tua. É como uma faca, esventra-me. Não sabes nem consegues imaginar a falta que tu me fazes no dia-a-dia; pode ser meloso, ridículo e alvo de chacota, se assim o quiseres, mas eu nutro tanto mas tanto por ti. Podes sentir o mesmo mas não tanto quanto eu. É estúpido quantificar um sentimento, ou se sente ou não se sente, mas por ti sinto mais do que devia sentir, sinto para além do sentimento; é o que me fazes.
Não só despertas o melhor em mim como o pior; por ti talvez seria a pessoa mais egoísta no mundo, não pensaria duas vezes em salvar-te se perante mim fosse posta a difícil escolha de salvar mil ou a ti.
Já te foste embora e a nossa despedida não foi marcada, não foi vinculada na minha memória e por isso agradeço-te. Por não teres tornado a tua saída memorável agora quase sinto que ainda estás aqui; ainda consigo sentir o teu cheiro pairar no ar, esse teu doce aroma que relembra-me todos aqueles abraços de segundos que para mim eram a eternidade, não queria nunca mais sair dali, dos teus braços; lembro-me dos teus olhos como duas grandes avelãs e como cada vez que os nossos olhos se encontravam na fuga de não nos encontrar e era como se Deus finalmente desse a resposta ao propósito da vida, isto.
A melhor coisa que me aconteceu foste sempre tu e agora foste embora sem nem a única palavra que sempre te quis ouvir dizer ecoares; não é justo! Eu pensava que o dirias antes desta partida, eu sabia que iria acontecer mas não de um momento para o outro.
A minha imaginação não me chega, preciso de ti aqui, agora, como nunca antes estivestes, presente; o amor que sinto por ti apenas me deixa nesta ilusão da espera do teu retorno, porque é que te foste embora? Porque é que me deixaste? Tu sabias que eu precisava de ti e mesmo assim partiste... No final, se calhar, nunca quiseste mesmo saber de mim, se assim o fosse nunca o farias, nunca me deixarias como me prometeste.
Se te foste então não quero mais viver, não preciso, é tudo em vão; é ridículo estar aqui a tentar pensar em verbalizar o que me transcende. Isto nunca foi um adeus, foi sempre um até já, tu não me vais deixar. Eu não preciso mais de te implorar, agora corro atrás. Nós, isso é que não foi em vão e é por isso que vou à tua procura; vejo-te do outro lado. Espero que me recebas com carinho.